Despedida do SV Valter Moreira (Bacurau) Salvamento aquático em LUTO!

“Nosso irmão de farda partiu dos mares da Bahia para os mares do céu. Surfará nas nuvens. A nós cabe a reflexão de que a vida é uma só e deve ser vivida um dia de cada vez. Porém, devemos viver intensamente aproveitando cada companhia de cada companheiro nosso que cruzamos por estas batalhas. Nós que lutamos no dia a dia com a vida e morte temos que aproveitar a passagem do nosso irmão. Que sempre foi muito querido por todos e como foi dito a exaustão no dia de hoje: Não tinha inimigos. Talvez ele queira nos ensinar a viver melhor. Ao mesmo tempo que lamentamos o colega não ter tido direito a ver a sua profissão regulamentada mesmo tendo doado 36 anos de sua vida a desempenhar a profissão de salvar vidas alheias. Lamentamos também por não tê-lo visto gozar de sua mais que merecida aposentadoria. Temos também o olhar para o fato de que ele trabalhou até os últimos minutos de sua vida. E que mesmo já desencarnado foi trazido de volta a sua casa a sede da Salvamar. Local onde foi velado por seus companheiros de batalha no dia que completava 36 anos de carreira. Talvez isto tenha significado muito maior do que o que aparenta. Talvez seja apenas mais uma aula do mestre Bacurau.”
Pedro Barretto

“Uma reflexão sobre a morte… e a vida!
O posto está vazio na praia. A praia está vazia. Há uma calmaria incomum, sem vento, mar sem ondas e uma inquietação profunda dentro do peito. Não há um sorriso largo e meigo a nós receber com o dia. Nem um café dividido no “taco” de pão com queijo. Nenhuma tristeza também deixou cinzas no chão. Nem nos fazer rir de bobagens. Nem pra debater com o fervor que uma boa discussão sobre coisas pequenas. O frio, agora, vai parecer menos intenso para tantos cobertores dobrados no armário. O sol do nosso quintal não será refúgio para o velho lobo. A batida forte da onda não provocará qualquer corrida à beira da vala. O olhar direcionado à linha de arrebentação fica mais triste e distante. Ninguém mais acena de com as mãos para qualquer passante. E as primeiras notícias da manhã, descritas nos jornais recém-jogados pelo entregador, já não virão do mesmo jeito.

Assim vão passar os dias… Apesar de parecem lentos, suas horas seguirão impiedosas e mostrarão que já se vão. Vão passar dois, três e sabe-se lá quantos meses mais. O tempo não para nem espera as dores cessarem. Em alguns momentos, ele não é gentil o bastante para aguardar a tristeza transformar-se em saudade, como dizem por aí. Tampouco paciente. O tempo é como as pessoas, sempre correndo. Com ele, na mesma batida, seguem, então, novos e velhos hábitos. Reinvenções. E se adapte quem quiser, quem puder. Ou quem for forte.

A morte, senhora dos destinos, é certeira e certeza. Leva quem tem que levar. Dia desses foi meu amigo velho. Amanhã, quem vai saber… A quem fica, além da ruptura dolorosa, ela oferece a chance de pensar e repensar sobre a vida. A danada te dá um soco na cara, te derruba no chão, te reduz de forma devastadora. Depois, delicadamente, pergunta se você está bem, se está amando o suficiente e como pretende seguir. Antes de sumir, lembra que irá voltar sem data marcada. E sempre deixa o alerta de que tudo passa rapidamente.

E ainda ali, sob o impacto da saudade, olhamos para a frente. Refletimos. Sobre a fé que em algum momento faltou e precisa ser renovada. Sobre as palavras boas que gostaria de dizer a alguém, mas não falou. Sobre o abraço que desejou dar e ainda está ao seu alcance. Sobre passar mais tempo com quem você ama e ver que não há programação melhor. Sobre trabalhar com mais leveza, pois não vai mudar o mundo.

As reflexões não param. Pensamos. Sobre deixar as coisas pequenas pra lá, porque perdem muito os que a elas se apegam. Sobre como colocar a raiva pra fora sem ferir ninguém. Sobre pedir desculpas e como o ato de perdoar alivia os tormentos da alma. Sobre os amigos que escolhemos e a lealdade que esperamos dessas pessoas consideradas especiais. Sobre isso, sobre aquilo… Refletimos sobre nós mesmos.

E sobre o fato de não sermos imortais. Eu, por exemplo, nunca quis acreditar que meu pai fosse partir. Também não imaginava o quanto sua presença implicava segurança, ainda que diante de tantas fragilidades. Ele me imprimia coragem. Dificuldades trouxeram crescimento. Sento-me agora no seu lugar posto que está vaga. Uma tentativa de preencher o vazio no meu coração. Pela frente, o corredor por onde devo seguir. Um breve sorriso, lembranças e o desejo simples de que as pessoas vivam bem cada minuto.”

Antonio Barbosa Barreto

1 Comentário

  1. Comovente despedida de Valter Bacural
    Por certo um salva-vidas muito amado, companheiro inesquecível, um professional padrão, um amante eterno da profissão que foi nato.
    Trabalhamos juntos no Salvamar Ba 1980-1990

    Luis Andrade
    Miami-Dade Fire Rescue
    Ocean Rescue Bureau
    Haulover Station Captain

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